Criação do Museu da Memória dos Sabores Mediterrâncos em articulação com o Campo Arqueológico de Mértola. O trabalho de investigação em curso envolve o estudo e levantamente das memórias da alimentação e da gastronomia no território.

Alimentando a reflexão:

” (…) Nas montanhas do norte de África, no Rife marroquino ou na Cabília argelina, zonas parecidas culturalmente com o nosso Sul, vivem camponeses e pastores há milhares de anos. Hoje são muçulmanos. Já foram cristãos em épocas mais antigas. Mas é semelhante o que sabem da terra e das técnicas agrícolas: como se empunha a rabiça do arado – o mesmo arado que em Portugal ainda se utilizava há 30 anos –, o jeito de enxertar e varejar a oliveira, a forma de fazer o azeite, a maneira de semear e cultivar as favas e o chícharo; as mesmas receitas, os mesmos saberes…
(…) A tradição passa também por uma longa e laboriosa preparação dos alimentos, de forma a aproveitar ao máximo as suas qualidades, com um mínimo de despesa. Em geral as comidas mais pobres, com menos carne e mais legumes, são as mais elaboradas, as mais trabalhadas, as que levam mais tempo a cozinhar, aproveitando todas as potencialidades dos seus ingredientes, pelo que são naturalmente mais saborosas e saudáveis.
(…) Em zonas de pobreza e épocas de fome, que sempre afectaram o mundo rural, tudo era para aproveitar e nada desperdiçar. Utilizar todos os restos, misturar pouca carne e muito pão, um pouco de vinagre, um fio de azeite, em suma saber acertar os temperos certos, criou uma gastronomia especial que hoje é nosso património inalienável.
(…) A civilização mediterrânica inventou ou encorporou praticamente todos os condimentos e ervinhas, criou-os nas suas hortas e jardins. Os legumes, na sua quase totalidade, nasceram no Mediterrâneo e daí saíram para os quatro cantos do mundo.
(…) A base tradicional da alimentação mediterrânica é a sopa. Quando não há mais nada, metem-se na panela todos os legumes de época, algum feijão, fava ou grão de bico e na melhor das hipóteses algum osso e deixa-se ferver longamente em fogo lento, por vezes toda a manhã. No acto de servir leva um fio de azeite que, assim cru, fica mais gostoso.”

Cláudio Torres
Conferência em Cachopo, Junho 2005

A recolha de memórias, técnicas e receitas tradicionais entre as comunidades rurais e agrícolas que ainda têm terra para trabalhar e que a sabem trabalhar, é fundamental para a transmissão de conhecimentos, para ensinar a uma outra geração como é que se faz e como se fazia no passado.